criação e apreciação da arte

Criação e apreciação da Arte3 minutos de leitura

Existe uma história clássica no budismo sobre como lidar com os desejos, pois na concepção budista a causa da infelicidade é o desejo. Essa história é sobre uma pessoa que tenta lutar contra o desejo, mas assim deseja não desejar, entrando num ciclo paradoxal de sempre desejar o que não tem. Mas como evitar o desejo se isso implica em desejar não desejar? Descartes e o seu “penso, logo existo” ajudam, pois para desejar é preciso existir. Além disso, para ter consciência do seu próprio desejo é preciso pensar. Poucas coisas nos proporcionam uma libertação disso, e a arte, no seu processo de criação e apreciação, é uma delas.

Isso descreve bastante a natureza humana, eternamente insatisfeita.

Schopenhauer aborda levemente este conceito, entre outros filósofos ocidentais; mas este é um conceito que está mais de acordo com o pensamento oriental.

Da necessidade de se desligar do cotidiano

Neste momento é útil para mim pensar sobre as características deste texto. Mas quando eu estiver na beira da praia relaxando, não. Seria inconveniente eu ficar pensando se deveria ter escrito “neste” ou “nesse”, assim como “deste” ou desse”, no início desse parágrafo. E sabemos que essas coisas acontecem frequentemente com quase todas as pessoas.

É muito raro conseguir estar em relaxamento total, sem se preocupar com coisa alguma. Isso cria uma tensão (é isso ou isto?) que muitas vezes é inútil. Para mim, pessoalmente, uma prova de que é preciso desligar do cotidiano, é a necessidade de dormir.

A arte nos proporciona uma condição, tanto no seu processo de criação quanto no seu processo de contemplação, de “não pensar”. Mas não uma falta de pensamento mesquinha ou vulgar. Da mesma forma, não uma falta de capacidade de pensar. Mas, pelo contrário, a arte nos proporciona a capacidade de se desligar desse pensamento mesquinho que está sempre no piloto automático. A arte, portanto, não te impede de pensar, muito pelo contrário, ela desperta o pensamento.

Porém, quando ficamos ligados o tempo inteiro, pensando nas preocupações da vida, compromisso, etc, estamos pensando apenas em termos de “não calar a mente”. Não existe utilidade para um cérebro raciocinando na hora do descanso. E é isso que acontece: as pessoas nas suas inconsciências cotidianas imitam a inconsciência umas das outras. Enquanto pensar é indispensável para se resolver os pequenos e os grandes problemas da vida, ser incapaz de desligar o cérebro e parar de pensar um instante gera desgastes desnecessários.

A Arte proporciona uma vivência mais profunda e real

O processo de criação e o de apreciação da Arte nos proporcionam, então, esta condição especial, em que conseguimos nos desligar por um instante da rotina (que inevitavelmente vai desgastar e exigir descanso) e mergulhar no cerne do que é a vida realmente. Não fugimos da realidade através da Arte, mas sim aprofundamos a realidade, nos livramos da casca de comportamentos inconscientes e conversas fúteis, para vislumbrar a essência por detrás desse teatro social.

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